
Há vinte anos era assassinado o grande líder ecologista Chico Mendes. Um mês antes ele estivera

Alfredo Sirkis

Apagando simbolicamente o fogo das queimadas.
Conheci o Chico Mendes em Xapuri, em 1987. Estava organizado o PV no Acre e fui a Xapuri encontrá-lo. Foi uma amizade intensa, instantânea, e um pacto imediato de apoio nosso à luta dos seringueiros que, na nossa ótica, representava a junção das lutas sociais e ambientais. Voltando ao Rio passei a montar uma rede de apoio ao Chico Mendes que logo veio ao Rio e participou de um encontro dos verdes em Petrópolis. Nessa época apresentei o Chico a João Augusto Fortes e alguns outros empresários que começavam a se interessar pela causa verde. João já sonhava em ajudar os seringueiros a criar produtos de latex que pudessem ser comercializados e sustentar as reservas extrativistas.
Nessa época fiz uma entrevistas com o Chico para o JB que não quis publica-la. O editor de então dizia que tinha mais interesse nos garimperos do que nos seringueiros. Com raiva lhe respondi que possivelmente se interessaria por ele quanto fosse assassinado. Tinha uma constante preocupação com o Chico que estava ameaçado de morte por vários pecuaristas que tinha impedido de amoliar sua "fronteira de pasto" realizando "empates". Um deles, Darli Alves, parecia o mais perigoso. O mais preocupante é que parecia haver um ligação da Policia Federal, supostamente lá para protegê-lo, com os fazendeiros inclusive Darli. O Conselho Nacional de Serigneiros descobriu que ele tinha crimes de morte no Paraná, inclusive um mandado de prisão. A informação foi vazada para ele que foi se esconder e jurou de morte o Chico que considerava responsável pela revelação de seus antecedentes.
No Rio, logo depois das eleições de novembro de 88, organizamos um grande ato chamado Salve a Amazônia consistia numa maratona andando, correndo e pedalando do Jardim Botânico ao Monumento a Estácio de Sá, no Aterro do Flamengo e a colocação de um imenso pano de juta com os dizeres Salve a Amazônia. Foi uma manifestação notável da qual tenho muitas imagens até hoje. Vejo e revejo as cenas: Betinho, Lucélia Santos, John Neschling, Gabeira, Minc, Nei Matogrosso, Luise Cardoso. Há uma cena do Chico conversando comigo no meu velho Opala verde oliva quando nos dirigíamos ao bondinho do Pão de Açucar. Falavamos sobre seus problemas de segurança e ele admitindo o perigo que representava o tal Darli Alves. Eu tentando convencê-lo a ficar no Rio até que conseguissimos fundos para contratar um grupo de seguranças particulares pois, pelas histórias que ele contava, os policiais que o protegiam eram pouco confiáveis. A certa altura achei que o tinha convencido. Nossas amigas Rosa e Dora também faziam pressão nesse sentido. O Chico decidiu ficar no Rio. Depois por pressão da esposa que ficara sozinha --queríamos trazer a familia dele também-- ele decidiu passar o Natal em Xapuri.
Chico entre Sirkis e Minc, no final do Salve a Amazônia.

Passaram já vinte anos do assassinato de Chico Mendes e do escândalo internacional decorrente, nada é capaz de afastar essa horrenda sensação de que talvez ele tenha morrido em vão. A pecuária, as monoculturas, a extração de madeira predatória e os assentamentos e “colonização”, cinicamente apresentados como “reforma agrária” na região amazônica, vêm agravando o quadro sem tréguas. Os ganho econômico e os avanços sociais vinculados a esses tipos de atividade são efêmeros e perversos: a péssima qualidade do pasto, o baixo preço e o enorme desperdício da madeira extraída, as dificuldades para a exploração agrícola, os ganhos econômicos e sociais predatórios, de curtíssimo prazo, sem sustentabilidade, que vaticinam uma catástrofe de implicações planetárias, ainda no horizonte de vida de nossos filhos e netos. Isso sem falar do drama atual, das cidades infestadas de fumaça, dos aeroportos fechados, das culturas tradicionais destruídas, da biodiversidade exterminada.
No Salve a Amazônia: Nei Matogrosso, Sirkis e, à esquerda, Chico.

O que cabe neste momento, na Amazônia, é um bom “freio de arrumação”. Uma moratória por cinco anos da extração nas áreas consideradas críticas, a expulsão das madeireiras asiáticas e uma estratégia de repressão combinada com uma assistência direta do poder público aos socialmente atingidos, com a criação de um subsídio para o não-desmatamento. Podem ser criadas frentes de trabalho onde os atuais cortadores de árvores sejam remunerados para recuperar áreas degradadas. É necessário quantificar essa ação e definir as zonas prioritárias. Salvar a Amazônia, permitindo ganhar tempo para um futuro desenvolvimento sustentável, certamente não sairá mais caro do que salvar um punhado de bancos falidos. Recursos internacionais seriam mais facilmente captados e melhor gastos nesse contexto.
Em 2007, manifestação do Brasil no Clima.

Fonte: Alfredo Sirkis.
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