quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Enxurrada em SC alerta para efeito devastador do aquecimento global

2/12/2008A quantidade de chuvas que caiu em uma semana em Santa Catarina preocupa a população do Estado e de outras regiões do país. Até a tarde de sexta-feira (28), foram registrados 78.707 entre desalojados e desabrigados. A Defesa Civil do Estado também registrou 100 óbitos e 19 desaparecidos. No total, são mais de 1.500 milhão pessoas afetadas.
Paula Cassandra*
Pesquisadores apontam que o motivo da enxurrada é uma seqüência de eventos meteorológicos. O pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônica (INPA), Antonio Manzi, explica que um bloqueio atmosférico foi o que desencadeou o início das chuvas. No entanto, ainda não é possível dizer porque o fenômeno ocorreu em Santa Catarina, já que a intensidade de chuva no local não é comum nesta época do ano.
“Tem algumas situações atmosféricas, da variação do tempo, no dia-a-dia, que estabelece uma massa de ar com alta pressão sobre uma região e aí ela não deixa passar, por exemplo, as frentes frias que vem do sul, que chegam até a região e não conseguem avançar e isso produz chuva no local”, diz.
Manzi argumenta que numa avaliação mais ampla, é possível relacionar a enxurrada catarinense com as mudanças climáticas globais. Mesmo que ainda não existam dados suficientes, estudos prevêem que as mudanças globais vão amplificar os fenômenos climáticos.
O meteorologista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), Olívio Bahia do Sacramento, relata que o fato dos eventos meteorológicos ocorrerem por dias consecutivos acentuou a quantidade de chuvas.
“Nós tivemos um intenso anti-ciclone atuando sobre o Atlântico e a circulação associada a este anti-ciclone trazia muita umidade do oceano para o continente. Além desses ventos trazendo umidade para o continente, tivemos outro sistema meteorológico atuando em torno de quatro, cinco mil metros de altura, que era o vórtice ciclônico, que intensificava ainda mais a instabilidade provocando grande volume de chuva ”, diz.
Diante da calamidade que tomou o Estado durante a enxurrada, os pesquisadores concordam que um planejamento urbano, que preveja eventos de tal magnitude, é o único jeito de minimizar os efeitos. Sacramento, do INPE, pondera que, igual a outros estados, Santa Catarina não está preparada para agir numa situação de emergência deste tipo.
Fenômeno extremo vai se tornar freqüenteNão há por enquanto uma explicação científica para o que ocasionou a seqüência de chuvas em Santa Catarina. Também não é possível associar o fenômeno ao aquecimento global - embora a possibilidade não possa ser descartada, afirma Carlos Nobre, climatologista do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
Eduardo Garaque**
"Esse é o tipo de fenômeno extremo que vai ocorrer mais no futuro. A grande pergunta é: o futuro já chegou?" A falta de uma série histórica para os eventos climáticos no Brasil de pelo menos 150 anos impede um julgamento mais definitivo.
"Em muitas partes do mundo [onde existem séries históricas], já se consegue apontar o aquecimento global como culpado por eventos climáticos extremos. Aqui, isso ainda não é possível", diz Nobre.As duas últimas grandes inundações catarinenses, em 1983 -que o pesquisador julga ter sido mais grave do que a atual- e 1998, estavam relacionadas com o fenômeno El Niño, diz Nobre, mas esse não é o caso agora. "Sem ele [El Niño], não existem elementos para a previsão."
O Cptec (Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos, ligado ao Inpe) não deu nenhum alerta nas últimas semanas sobre o risco de fortes inundações porque seus modelos não conseguiram prever as chuvas anômalas do último fim de semana, diz Nobre. Para o pesquisador, a situação poderia ter sido até mais grave.
"Algo muito parecido - meses de chuvas intensas com dias de chuvas muito intensas - ocorreu na Venezuela em 1999. Morreram 40 mil pessoas." Segundo Nobre, o sistema de defesa estadual de Santa Catarina, "o melhor do país", evitou que a tragédia desta semana tivesse sido maior.
Física
A física atmosférica consegue, no entanto, explicar o fato isolado, ou seja, o motivo de ter chovido tanto no fim de semana.
A temperatura dos oceanos está quase 1C acima do normal. Com isso, mais água evapora. Na alta atmosfera, o contrário. Está bem mais frio do que o esperado (quase 15C de diferença). Isso faz com que a umidade precipite com mais velocidade.
"E também existe um centro de alta pressão no oceano que bloqueia o ar que está vindo do sul", diz Paulo Artaxo, físico da USP. "Isso mostra que o evento foi anômalo". Para Artaxo, também está claro que eventos extremos do tipo vão ocorrer no futuro.
* reportagem publicada pela Agência de Notícias Chasque, 29-11-2008.
** reportagem é publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, 29-11-2008.


Fonte: Imprensa MST.

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